A presidente Dilma Rousseff (PT) foi reeleita em uma apertada disputa e prometeu estender sua luta contra a pobreza, mas ela terá que restabelecer a ordem nas contas públicas no segundo mandato para colocar uma paralisada economia brasileira de novo nos trilhos.
Dilma venceu o candidato Aécio Neves (PSDB) na eleição no domingo, com forte apoio de eleitores mais pobres, apesar da dificuldade do país em controlar a inflação, atrair investimentos e reviver a economia que caminha para o quarto ano de crescimento modesto.
Com uma campanha eleitoral dura que ficou para trás, Dilma agora enfrenta agora a difícil tarefa de restaurar o brilho de uma economia que já foi a queridinha de Wall Street, mas que tem sido atingida por tropeços políticos e por maus ventos econômicos globais que prejudicam a demanda por exportações brasileiras.
Para isso, ela terá de mover-se rapidamente para estancar o sangramento nas contas públicas do Brasil, que adicionou pressão sobre a inflação e erodiu a confiança de investidores na maior economia da América Latina. Se não sanear as contas públicas, o país pode ter seu rating de crédito rebaixado no próximo ano.
A dúvida é se Dilma, que defende uma economia orientada pela presença do Estado, está comprometida o suficiente com disciplina fiscal para assumir as difíceis reformas tributária e da Previdência ou para cortar gastos em programas sociais populares.
“Tudo vai depender de política fiscal, mas não há muita margem de manobra para fazer um ajuste muito drástico no curto prazo, dada a rigidez do Orçamento”, disse o conselheiro e ex-presidente do Banco Mundial, o economista Otaviano Canuto, que alguns representantes do governo dizem ser um forte candidato a ser ministro da Fazenda no novo mandato de Dilma.
Cerca de 90 por cento das despesas no Orçamento federal são obrigatórias por lei, o que significa que o governo não tem muito espaço para cortes expressivos sem reduzir investimentos públicos ou programas sociais.
“Qualquer ação fiscal deveria ser acompanhada por alguma reforma de médio e longo prazo para reforçar a confiança”, acrescentou Canuto, que se recusou a comentar sobre as especulações de seu nome para a Fazenda.
Dilma adotou um tom conciliador em seu discurso de vitória na noite de domingo, comprometendo-se a trabalhar com adversários políticos e líderes empresariais para inaugurar uma nova era de crescimento econômico.
“Vamos dar mais impulso à atividade econômica em todos os setores, em especial no setor industrial”, disse ela. “Quero a parceria de todos os segmentos, setores, áreas produtivas e financeiras, nessa tarefa que é responsabilidade de cada um de nós brasileiros e brasileiras.”
Ela também tentou aliviar investidores preocupados com a situação fiscal do Brasil, dizendo estar comprometida em combater com rigor a inflação e com a responsabilidade fiscal.
O déficit nominal no Brasil tem crescido de forma significativa na administração Dilma, como resultado de maiores gastos públicos e concessão de dezenas de cortes de impostos a indústrias para melhorar a economia. Apesar disso, a produção industrial não se recuperou e seu governo foi duramente criticado por lançar mão de manobras contábeis para elevar o superávit fiscal.
O buraco no orçamento, se desconsideradas as manobras contábeis, que incluem o atraso de pagamentos e o saque de recursos do Fundo Soberano do Brasil para fechar as contas, seria maior.
“BAGAGEM IDEOLÓGICA”
Os desafios de Dilma não se limitam à área fiscal.
Depois de manter os preços da gasolina e da eletricidade artificialmente baixos nos últimos anos para ajudar a conter a inflação, a presidente está sob pressão para finalmente deixar que eles subam.
Um aumento seria uma boa notícia para a estatal Petrobras e para distribuidoras de energia, mas iria complicar os esforços de Dilma de combater a inflação e poderia acabar erodindo sua popularidade.
Uma queda nos preços das commodities devido à desaceleração da economia global e juros maiores nos Estados Unidos poderiam pesar nos esforços para ampliar o crescimento da economia brasileira.
Investidores estão longe de estarem convencidos de que Dilma agirá decisivamente para lidar com tantos desafios econômicos no Brasil em seu segundo mandato, que começa em 1º de janeiro.
As ações brasileiras e o real caíam todas as vezes que Dilma avançava numa pesquisa de intenção de voto na campanha eleitoral e devem enfrentar outro dia difícil na segunda-feira.
“Ela não fez nenhuma mudança em seu primeiro mandato, então eu não penso que ela vai mudar a forma de governar no segundo mandato, disse o economista especialista em contas públicas, Raul Velloso. “Ela tem uma pesada bagagem ideológica e isso não muda da noite para o dia.”
Embora Dilma tenha prometido substituir o amplamente criticado ministro da Fazenda, Guido Mantega, os mercados permanecem céticos de que ela mudará de forma drástica a condução da economia e que será menos intervencionista.
Alguns investidores que miram no longo prazo, contudo, estão esperançosos de que a ameaça de um rebaixamento do rating fará Dilma ser levemente mais amigável em relação aos mercados.
Empresários têm pedido há tempos por reformas que reduzam a burocracia, simplifiquem o complexo sistema tributário e modifiquem o sistema previdenciário que colocam sob pressão os resultados corporativos.
Dilma concorda que muitas dessas reformas são necessárias, mas até agora mostrou pouca disposição de se engajar politicamente para fazer com que elas aconteçam através do Congresso Nacional.
Mesmo com uma clara maioria no Congresso, Dilma tem tido dificuldade em aprovar matérias no Legislativo. Um segundo mandato com um novo Congresso mais fragmentado será um complicador adicional para qualquer esforço para reduzir o chamado custo Brasil.
As empresas brasileiras gastam em média 2,6 mil horas por ano calculando os impostos que devem, de acordo com estudo do Banco Mundial. Isso é quase 15 vezes o tempo necessário para se fazer a mesma coisa nos Estados Unidos.
O México e a Colômbia, que embarcaram em reformas mais ambiciosas para abrir suas economias, estão crescendo a um ritmo mais de duas vezes acima do Brasil.
A expectativa é que a economia brasileira mal cresça neste ano e se expanda em apenas 1 por cento em 2015, longe dos 7,5 por cento em 2010, ano anterior à posse de Dilma.
“Eu não acredito que o Brasil pode evitar ficar distantes da tendência global de reformas”, disse o vice-presidente de investimentos para mercados emergentes no UBS Wealth Management, Jorge Mariscal.
“Não há mais demanda externa para conduzir a economia (doméstica).”