O presidente Mauricio Macri inaugura na manhã de hoje (1º) as sessões deste ano do Congresso argentino. Em seu discurso, Macri deve anunciar que a recessão econômica no país acabou. Ele também deve pedir que os legisladores argentinos aprovem uma lei que puna as empresas por corrupção. A nova lei permitirá, entre outras coisas, que a Justiça argentina multe a empreiteira brasileira Odebrecht, que confessou ter pago US$ 35 milhões em propina no país.
A legislação também deve possibilitar acordos econômicos e de delação premiada com a Odebrecht ou com qualquer uma das 98 empresas investigadas hoje na Argentina como consequência da corrupção no Brasil.
No discurso de abertura das sessões legislativas, Macri vai pedir a aprovação da chamada Lei de Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas. Hoje, mesmo se quisesse, a Justiça argentina não poderia multar, nem chegar a um acordo com a Odebrecht, que confessou ter pago US$ 35 milhões em subornos na Argentina, entre 2007 e 2014.
Sem uma lei que estabeleça um regime de penas às empresas que subornarem funcionários públicos, a ação da Justiça é bem limitada. O código penal argentino só prevê sanções por corrupção para pessoas físicas. Para as empresas, nem sequer estão previstas sanções administrativas.
A Odebrecht já chegou a acordos econômicos e de cooperação com Panamá, Peru, Colômbia, República Dominicana e Equador, mas a Argentina não pôde nem multar a construtora brasileira. A nova lei será crucial para o combate à corrupção na Argentina, mas também beneficiará o Brasil porque as revelações de uma empresa no país podem auxiliar nas investigações da Justiça brasileira.
Exigência da OCDE
A iniciativa de alterar o código penal para penalizar empresas em casos de corrupção, lavagem de dinheiro e outros ilícitos é uma exigência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), à qual a Argentina quer se integrar. Mas o caso Odebrecht pressiona a Argentina por uma legislação contra a corrupção empresarial.
No caso das pessoas físicas, a lei que permite a delação premiada individual é de outubro passado. Tem poucos meses de existência. E, em boa parte, foi decidida pelo exemplo do sucesso das delações premiadas da Lava Jato no Brasil.
Esses dois elementos ajudam a explicar por que a Argentina é um dos países mais atrasados na investigação de subornos da Odebrecht, quando comparada, na região, com Peru ou com Colômbia, por exemplo. As investigações nos países vizinhos estão estruturadas em mais de 90% em provas obtidas através de delações, algo que só agora a Argentina conhece. Atualmente, 98 empresas ligadas às empreiteiras brasileiras envolvidas na Lava Jato estão sendo investigadas no país.
Odebrecht ainda não foi punida na Argentina
Por enquanto, o governo argentino não pretende punir a Odebrecht. Ao contrário de países como Peru, Colômbia, Panamá, República Dominicana e Equador, que multaram, chegaram a acordos econômicos com a Odebrecht, suspenderam a empresa brasileira de novas licitações e até cancelaram projetos, o próprio presidente Mauricio Macri não indicou sanções à empresa.
Em resposta a uma pergunta da reportagem da Rádio França Internacional (RFI) sobre o tema, o presidente argentino disse que, “se a Odebrecht confessar com quem fez transações aqui, poderá continuar trabalhando na Argentina no futuro”.
Quando esteve em Brasília no último dia 7 de fevereiro, Mauricio Macri visitou o Supremo Tribunal Federal e pediu pessoalmente à presidente do STF brasileiro, Cármen Lúcia, os nomes dos argentinos implicados nos subornos.
Consequências das delações da Odebrecht
As delações da Odebrecht no Brasil vão chegar à Argentina a partir de 1º de junho, quando vence a cláusula de confidencialidade das delações premiadas no acordo entre a Justiça brasileira e a empreiteira sobre atos de corrupção praticados pela empresa no exterior. O fim desse sigilo pode impactar politicamente a Argentina, que estará em plena campanha eleitoral para as eleições legislativas de outubro.
O governo acredita que as delações da Odebrecht vão beneficiar uma vitória governista, porque o período de subornos na Argentina foi até 2014, quando a ex-presidente Cristina Kirchner estava no poder. Alguns dos ex-ministros e ex-secretários dela já são investigados.
Mas a imagem do presidente Macri poderia sair afetada através da sua família. Em algumas obras, a Odebrecht fez parcerias com a empreiteira argentina IECSA e o dono dessa empresa é Ángelo Calcaterra, primo do presidente Macri. E já existem indícios de que a IECSA teria participado dos subornos pagos pela empreiteira brasileira na Argentina.