No dia 1º de março completa um ano que entrou em vigor a alteração nas regras para para facilitar o acesso de consumidores à geração da própria energia. A mudança favoreceu o surgimento de cooperativas e elevou consideravelmente o número de consumidores que passaram a produzir e injetar energia no sistema de distribuição de suas cidades.
Até hoje, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) registrou mais de 8,3 mil conexões de consumidores que geram e distribuem energia, com um crescimento exponencial em relação ao mesmo período do ano anterior, quando havia pouco menos que 2 mil conexões. Dentre as novas conexões está a da Cooperativa Brasileira de Energia Renovável (Coober), em Paragominas, no Pará, na qual 23 cooperados são beneficiados com a geração de uma microusina fotovoltaica com capacidade de gerar 75 kilowatts-pico.
Para Raphael Vale, presidente da Coober, a possibilidade de gerar energia organizado em forma cooperativa é uma revolução para a economia brasileira.“É uma liberdade, uma democracia energética. Nós estamos falando de uma quebra de paradigma grande. Você deixa de ser consumidor de energia e passa a ser produtor e consumidor, passa a ser prosumidor. Então é algo que talvez as gerações futuras, meus netos, vão olhar para trás e dizer: Nossa, como vocês gastavam tanto em linhas de transmissão caríssimas, com impactos ambientais e sociais tremendos”.
Embora a Resolução 482 da Aneel , que criou o Sistema de Compensação de Energia Elétrica para facilitar a instalação de pequenos geradores em residências e comércios, seja de 2012; a regra permitia apenas que o consumidor fosse beneficiado com a redução no valor da fatura de energia elétrica na própria unidade ou em outro local distante que fosse cadastrado com o mesmo titular.
Mas três anos depois, a Resolução 687/15 , que passou a vigorar em março de 2016, mudou as regras possibilitando a existência de cooperativas, o que facilitou o acesso a esse tipo de geração de energia, além de aumentar a possibilidade de geração de potência a 3 megawatts (MW) para fonte hídrica e 5 MW paras as demais fontes renováveis.
Segundo Daniel Vieira, especialista em regulação da Aneel, com a mudança os consumidores passaram a contar com mais duas formas de gerar a própria energia e usufruir dos créditos, uma para empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras, que envolve a geração e consumo por condomínios residenciais ou comerciais, nesse caso a geração fica no mesmo local das unidades consumidoras e o excedente é dividido entre todos.
E outra que é a geração compartilhada, na qual os consumidores se unem por meio de consórcio ou cooperativa e a unidade gera energia. Nesse caso, o excedente pode ser passado em forma de crédito para diminuir a conta de luz dos cooperados e consorciados em outras unidades distantes da unidade geradora. Essa mudança possibilitou o surgimento da Coober e de outras cooperativas pelo Brasil.“O que a Aneel fez foi reduzir barreiras para que isso acontecesse”, diz o especialista.
Segundo Raphael Vale, a Coober foi idealizada no período entre a publicação da mudança da resolução, em 24 de novembro, e a data em que entrou em vigor. “A linha do tempo da Coober é muito rápida. Dia 24 de fevereiro constituímos a cooperativa, em abril definimos o terreno, em maio recebemos um estudo de viabilidade”. Ele explica que esse estudo de viabilidade foi fornecido pela Confederação Alemã das Cooperativas que enviou um consultor e um técnico para avaliar a produção de energia no local escolhido. “Em julho começaram as obras, em agosto estava pronta a microusina”, complementa.
De acordo com o analista da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), Marco Olívio Morato, a inclusão da modalidade de geração compartilhada foi o resultado de uma sugestão da OCB durante a audiência pública feita pela Aneel, para debater o assunto. “A gente vê no cooperativismo uma forma de universalizar a possibilidade de gerar energia própria, ou seja, quem não tem casa própria pode se unir em uma cooperativa e instalar os painéis solares conjuntamente”. Moradores de prédios e espaços pequenos também são beneficiados pela possibilidade de gerar a própria energia em uma cooperativa.
Depois que a resolução normativa foi ampliada a própria OCB passou a monitorar possíveis grupos que teriam potencial interesse em se organizar em uma cooperativa e montar uma usina para gerar energia compartilhada. O primeiro grupo a concretizar foi a Coober, mas atualmente já existem 27 conexões registradas na Aneel na modalidade geração compartilhada. “A gente tem no radar mais quinze grupos interessados em montar cooperativas no Brasil todo praticamente”.