Em uma situação inédita desde que assumiu o governo, a presidenta Dilma Rousseff desceu a rampa do Palácio do Planalto e foi abraçada por centenas de mulheres que foram ao local prestar solidariedade a ela. Dois dias depois de a Câmara dos Deputados ter aprovado a abertura do processo de impeachment contra ela, cerca de 500 pessoas, de acordo com a Polícia Militar, permaneceram por mais de duas horas entoando hinos de apoio, oferecendo botões de rosa e disputando espaço para ter um contato mais próximo com a presidenta.
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Após receber um grupo de 20 mulheres em seu gabinete, a presidenta atendeu ao pedido de uma delas e desceu a rampa do Planalto para cumprimentar pessoalmente as pessoas que se enfileiravam de frente o Planalto. A atitude surpreendeu os assessores e a segurança de Dilma, que, diferentemente do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não costuma ter contato com populares em Brasília. Geralmente, em eventos de governo, ela apenas abraça algumas pessoas que estão próximas ao palco.
Para alegria dos que estavam presentes, a presidenta saiu do Salão Nobre do Planalto e caminhou por 20 minutos em frente à barreira que a separava dos manifestantes. Esta foi a primeira vez que Dilma percorreu o trajeto de descer, percorrer a frente do palácio e subir a rampa a não ser em cerimônias oficiais. Ao retornar, antes de caminhar para o seu gabinete, a presidenta se virou novamente para trás, mandou beijos e disse: “Eu estou de alma lavada”.
Apoio à presidenta
As mulheres presentes comemoraram o fato de Dilma ter chegado até perto e, sorridente, beijar e abraçar a maioria das que conseguiram chegar na primeira fila. A via da Esplanada dos Ministérios, nos dois sentidos, foi interrompida durante parte da manifestação. As mulheres gritavam palavras de ordem como “Não vai ter golpe, já tem luta”, “Dilma querida, você fica”, e “Sobe e desce, a rampa é sua”
“Toda agressão que foi no domingo, as falas me movimentaram muito para estar aqui enquanto mulher reconhecendo o que isso significou pra ela. E reconhecendo também que aquilo foi uma violência para o Brasil e que isso aqui ser um ato específico para a Dilma é um ato simbólico também, de a gente continuar acreditando nas possibilidades do Brasil de não ir por esse lado mesmo, da violência, da desqualificação”, disse a servidora pública Marina Machado, de 30 anos.
Visivelmente emocionada, a professora Rosângela Lopes da Silva, 28, relatou que compareceu ao local para dar um abraço a Dilma, porque a justificativa dos deputados para dizerem sim ao impeachment a deixou triste. “Quando o [deputado Jair] Bolsonaro [PSC-RJ] chegou lá para defender um militar eu chorei, eu cheguei na minha casa chorando, porque eu sou mulher, eu sei o que a Dilma sofreu, eu sei o que ela sofre para governar este país. E eu queria vir aqui hoje para dizer para ela: ‘Dilma, se quando você estava torturada eles disseram para você que você está sozinha, nós estamos aqui hoje com você’”, disse.
Botões de rosa
Além de empunhar cartazes e carregar botões de rosa, muitos dos quais foram entregues ou lançados em direção à presidenta, as mulheres também gritavam palavras de apoio como “Dilma, guerreira, da pátria brasileira” e “A minha presidente é coração valente”. Para a doutoranda Pollianna Freire, 28, o ato foi uma forma de demonstrar que tem “muita gente” ao lado de Dilma.
“Como feministas, mulheres, negras, baianas, nordestinas, tocantinenses, é prestar nossa solidariedade à presidenta que está sendo atacada em todas as frentes. Além do golpe estar sendo articulado por uma mídia golpista, por um Congresso patriarcal, Dilma está sofrendo por ser mulher”, disse.
A presidenta Dilma disse que a democracia, para ela, também é uma questão de luta contra o preconceito de gênero
Contra o preconceito
Durante o encontro com parte das mulheres, a presidenta disse que a democracia, para ela, também é uma questão de luta contra o preconceito de gênero. “Tem um certo tratamento, que é uma tentativa de diminuir, de colocar a mulher como uma pessoa que não tem força para resistir à pressão. Um ser cuja fragilidade não está na sua capacidade de sentir, mas cuja sua fragilidade é de caráter, isso é um absurdo, eu me rebelo contra isso. Acho que as mulheres desse país são mulheres fortes, que comprovaram isso ao longo da história e que hoje saem de casa, vão trabalhar, criar seus filhos, lutam todo dia. Elas não são frágeis, enfrentam dificuldades e nunca desistem”, disse.
Uma das presentes na manifestação, que quis se identificar apenas como Vera Lúcia, disse que esteve presente no ato por ter “consciência política” e “vergonha na cara”. “Na minha cara ninguém passa óleo de peroba. É dignidade, respeito por esse país. A gente tem que viver uma democracia. Nós não merecemos, e vocês que são mais jovens, não merecem passar por isso pela segunda vez”, disse.