Laudo contradiz versão que delegado divulgou contra a vítima tatuada com suástica

Delegado relatou nesta quarta (24) que a jovem não foi marcada com um canivete, como ela teria relatado, mas com brincos ou clipes. Laudo pericial, por outro lado, diz que canivete pode, sim, ter sido utilizado na ação. Além disso, a versão vendida à imprensa, de automutilação, não foi comprovada com base no exame, ressaltaram os peritos

Jornal GGN – O delegado Paulo Jardim afirmou à imprensa, nesta quarta (24), que uma jovem de Porto Alegre praticou automutilação com bijuterias ou clipes, e depois culpou apoiadores de Jair Bolsonaro pelo ato, mas o laudo pericial realizado após exame de corpo de delito contradiz a fala do responsável pela investigação.

À reportagem da BBC News Brasil, Jardim descartou o uso do canivete, que foi o objeto citado pela jovem, e citou objetos que fazem parte do imaginário feminino, como “brinco ou clipe”, reforçando sua tese de que houve automutilação.

“(…) São arranhões, e não cortes. A perícia indica que foi usado um objeto contundente, como um brinco ou um clipe, mas não cortante como um canivete. Mesmo quando a vítima está imobilizada os cortes não são tão uniformes ou superficiais assim”, disse ele.

No laudo, peritos escreveram que, na lista de itens que podem ter sido utilizados para marcar uma suástica no corpo da jovem de 19 está “lâmina metálica”, “como a de um canivente ou mesmo uma faca”, corroborando a versão da denunciante.

GGN teve acesso à íntegra do laudo técnico, que ressalta que o desenho foi feito de maneira superficial e isso demandou “zelo” e “cautela” do autor. Para isso, a jovem teria de ter colaborado. No depoimento que prestou à delegacia, ela relatou que não ofereceu nenhuma resistência.

Trecho extraído da página 7 do laudo pericial

DELEGADO DESCARTOU HIPÓTESE QUE CORROBORA VERSÃO DA VÍTIMA
Outro dado que chama atenção é que, ao contrário da versão que predomina na imprensa, a automutilação ou mutilação com consentimento e premeditado não é a única hipótese levantada pelo laudo pericial.
Ao contrário: os peritos escreveram que não é possível “afirmar categoricamente que a lesão seja autoinfligida”.
“(…) embora não seja possível afirmar categoricamente que a lesão seja autoinfligida, pode-se concluir, com convicção, que a possibilidade de uma agressão que tenha acontecido sem que tenha havido alguma forma de colaboração da parte da vítima ou sem que tenha havido marcada incapacidade de reação da parte dela é muitíssimo diminuta.”
O delegado Jardim – o mesmo que, antes de investigar o caso, disse à imprensa que achava que a suástica era, em verdade, um símbolo budista – descartou a tese que favorecia a vítima argumentando não ter encontrado outros indícios que corroborassem com o relato da jovem, como gravações em câmeras de segurança ou testemunhas in loco.
Além disso, pelas declarações que deu nesta quarta (24), ele reproduziu um ponto de vista que consta no laudo, que é versão de que, numa situação dessa, o “normal” é a vítima tentar se defender, e não fica inerte.
A aceitação dessa teoria implica no descarte do depoimento da jovem, registrado no laudo pericial, de que não ofereceu resistência. “A ausência de lesões de defesa, como cortes ou contusões, particularmente nas mãos e nos antebraços também corroboram a tese de que não teria havido reação da parte da periciada”, escreveram os peritos.
Procurado na 1ª DP de Porto Alegre, o delegado Jardim não foi encontrado para comentar esta matéria.
A jovem será indiciada por falso testemunho.
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