Marcha da Maconha pede mudança em política de drogas e liberação do consumo

A Marcha da Maconha saiu às ruas do Recife nesse sábado (20), para protestar contra políticas proibicionistas e criticar o perfil de encarceramento no Brasil. Há dez anos, manifestantes participam da marcha, em defesa da legalização da cannabis sativa, da liberação do consumo e do cultivo da planta em casa.

O ato começou na Praça do Derby e seguiu pela Avenida Conde da Boa Vista rumo ao Recife Antigo, onde, na Rua da Moeda, houve um festival com música ao vivo, que também faz parte da programação da marcha. De acordo com Ingrid Farias, do ColetivoAntiproibicionista de Pernambuco, que organiza o protesto, a política de drogas no país não cumpre o objetivo de tornar a sociedade mais segura. Para ela, ocorre o efeito contrário.

“A política de drogas hoje só encarcera as pessoas pobres e negras. O número de encarceramento aumentou bastante nos últimos tempos por causa dessa política. Para nós, é importante mudar o modelo para parar de encarcerar o povo pobre e negro”, defende. Ingrid afirma ainda que este ano a marcha está nas ruas para pedir o fim das políticas proibicionistas, não só de drogas.”A [proibição] do aborto, por exemplo, a política ruralista que impede que a gente possa comer de forma saudável”, lembra.

Os participantes carregavam faixas pedindo a descrimininalização e legalização da maconha, tanto para uso medicinal quanto recreativo. Mensagens como “prefiro minha erva à sua tarja preta” e “sua hipocrisia mata gente todo dia” eram expostas em cartazes. Manifestantes também levaram faixas pedindo liberdade para Rafael Braga, flanelinha condenado durante as manifestações de 2013 por ser flagrado portando Pinho Sol. O jovem foi considerado culpado pela Justiça, novamente este ano, por tráfico de drogas – ele portava, na ocasião, 06 gramas de maconha, 9,3 gramas de cocaína e um rojão, segundo a Polícia Militar (PM). Rafael acusa os policiais de plantar as drogas para incriminá-lo.

Para o representante do coletivo Muda e do Centro de Prevenção às Dependências (CPD), Roberto Rocha, de 23 anos, o primeiro passo é tirar o estigma da maconha e informar sobre seus reais efeitos e consequências. Ele trabalha como agente redutor de danos no CPD e defende que a substância causa menos problemas que drogas legalizadas e amplamente consumidas pelos brasileiros.

“É uma droga de pouquíssimo potencial ofensivo, seja para quem consome ou para a sociedade, se comparada a outras lícitas, como o tabaco e o álcool. É desistigmatizar, antes de tudo, o que é maconha e o que ela representa. E depois pensar em política pública: em descriminalizar, preparar o sistema de saúde para acolher o usuário, legalizar”, argumenta. A legalização, para ele, seria tanto para o cultivo doméstico quanto para a comercialização, desde que a venda fosse regulada de forma a impedir a sua transformação “em um grande negócio para grandes empresas”.

Maconha medicinal

Um grupo de mães que têm filhos com doenças tratadas com substâncias derivadas da maconha esteve na marcha. Elas também defendem a liberação do cultivo em casa, para que as famílias que preciam dos medicamentos à base da planta não dependam do mercado para o tratamento. Atualmente, cerca de 50 pessoas fazem esse uso em Pernambuco – a maioria, crianças.

Ceça Correa é um delas. Seu filho, Manoel, de 6 anos, tem epilepsia refratária, tipo da doença difícil de controlar. Há um ano, a mãe decidiu recorrer ao remédio produzido a partir da maconha, depois que cinco antiepiléticos diferentes não surtiram resultado. “A gente tem visto melhora nas crianças. Cessando crises, aspecto psicomotor melhor, cognição. Eu tive indicação do meu filho usar sonda por apetência, que é falta de fome, e hoje ele voltou a comer. Sem contar que deixou de ter crise epilética, consegue estar mais com a gente e ter mais anos de vida”, diz.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) incluiu a maconha na lista de plantas medicinais no início de maio. Em janeiro, o órgão registrou o primeiro remédio à base da planta no país. Mas essas decisões não descriminalizam o cultivo doméstico, que é a principal reivindicação das mães. “A gente não tem dinheiro para comprar e se for pedir via judicial, não tem mais condição psicológica de ir atrás. E, mesmo assim, seria uma sangria do SUS [Sistema Único de Saúde]. A gente quer conseguir plantar no quintal, sabendo a procedência do solo e de como as plantas estão sendo armazenadas e cultivadas”.

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