Nascido em Lages, Santa Catarina, o treinador Marquinhos Xavier completa, nesta terça-feira (17), 100 jogos no comando da Seleção Brasileira. Marquinhos tambem é Mestre e Doutor em Ciências do Movimento Humano, Escritor e Palestrante.
A CBF TV aproveitou um dos momentos em que ele, reservado, se dedica ao trabalho na companhia do seu chimarrão para gravar uma entrevista onde conta um pouco da sua trajetória e fala emocionado o que a Seleção Brasileira representa na vida dele.
Marquinhos, vamos começar por seus números à frente da Seleção, que são impressionantes. Falta apenas um para completar 100 jogos. São 83 vitórias, oito empates, oito derrotas, dez títulos conquistados e um aproveitamento de 86,53%. Traduz esses números para a gente.
É uma tarefa difícil, porque tem muito trabalho nesse meio todo, nesse intervalo de mudanças de ciclo de um para o outro. Tem uma gama enorme de pessoas que contribuíram muito para que isso acontecesse. Eu acho que tem uma visão desenvolvimentista dentro de todo esse trajeto. Para mim, a Seleção é isso. É uma referência de desenvolvimento para os clubes, para os profissionais que trabalham em clubes. Então os números impactam no primeiro momento, mas no segundo momento eles têm um propósito que eu acho que é o mais importante. A gente foca muito no desempenho da equipe, porque quanto melhor o desempenho, mais próximo das conquistas vamos estar. Ter um equilíbrio dentro do desenvolvimento não só aponta para uma direção de conquistas importantes, mas principalmente do orgulho que as pessoas têm de ver a sua Seleção jogar. Afinal de contas, o povo brasileiro tem esse sentimento com a camisa da Seleção Brasileira. Ela sempre foi um símbolo e continua sendo um símbolo importante dentro do nosso país. Eu acredito muito nisso. Desde o início, desde o primeiro jogo, que eu me recordo muito bem, em 2017 contra o Uruguai, uma vitória difícil, apertada, minha estreia por 1 a 0, até os dias de hoje, onde a gente está no Mundial, vivendo aqui os sete mais importantes jogos desse ciclo todo. Então é uma trajetória que me anima. Não pelos números frios, estatísticos, mas pela construção. Acho que as pessoas passaram a acreditar porque a gente trouxe essa comunidade pra perto da gente. O senso de pertencimento, elas sentem que fazem parte dessa história porque elas realmente fazem. A gente incluiu quem tá lá fora no nosso ambiente diário, todos os dias isso é fomentado aqui dentro.
Você falou que a sua chegada na Seleção foi em 2017, fez o ciclo de 2021 e vive agora o ciclo de 2024. Existe uma evolução na estatística, de número, vemos isso taticamente e tecnicamente. Eu queria que você falasse sobre o trabalho que foi feito para essa evolução acontecer.
O mais importante foi a necessidade de uma renovação. A gente termina o ciclo de 2016, o Mundial na Colômbia, com uma necessidade muito evidente de que nós precisamos preparar esse terreno. E a gente vai buscar isso no ciclo de 2017 até o Mundial de 2021. A gente debuta dos 16 atletas que jogaram o Mundial de 2021, 12 deles estavam disputando pela primeira vez, então a gente dá o primeiro passo nessa renovação. E hoje a gente tem aí a possibilidade de dar o segundo passo, já ter uma Seleção mais experiente, com uma vivência um pouco maior, então esse salto, por meio dos números também, que eu acho que a gente tem que sempre se balizar por isso, eles demonstram que há uma evolução não só de estrutura, mas de mentalidade. A gente se conectou mais com a nossa identidade de jogo, se conectou mais com a forma como o torcedor quer que a gente jogue, sendo mais sanguíneo, sendo mais livre dentro do jogo também, porque as estruturas permitem que o atleta individualmente possa criar e ter essa autonomia para ousar fazer coisas que é do futsal brasileiro, que é da nossa cultura, mas por outro lado, de uma forma organizada, que não seja algo anarquico, então acho que essa mudança ficou muito mais fortalecida nesse ciclo pela oportunidade que a gente teve de repetir convocações, de oportunizar também a outros profissionais estarem nesse cenário, de valorizar as vezes quem está fazendo uma boa competição, mas é claro, ao final você tem o compromisso também com o resultado, a gente nunca pode abandonar isso, porque certamente se a gente não constrói esses resultados talvez o ciclo já podia ter sido interrompido. Então o atleta, o staff, entendem isso, aqui a gente precisa ter uma produtividade, foi isso que a gente buscou, mas sempre olhando pro lado humano também, sempre entendendo que derrotas, um desempenho abaixo, também vão fazer parte dessa construção e que mesmo a gente, às vezes não atuando bem, é possível ganhar, porque também é possível perder quando a gente atua muito bem, que é o esporte. Acho que já há uma acomodação desse conhecimento, dessa filosofia de trabalho nesse ciclo que a gente está vivendo agora.
Aqui você falou de aprendizado e a gente sabe que competições, jogos, torneios, não deixam de ser um intercâmbio de conhecimento, de vivência. Existem escolas tradicionais na modalidade. Como é esse aprendizado com toda essa experiência que você teve diante de outras escolas e que podem fazer a diferença agora no mundial?
Acho que é um dos temas que eu mais gosto de falar é sobre essa conexão com outras pessoas, com outros países, com outras culturas. Eu me preocupei muito em tentar entender como os nossos atletas brasileiros que nascem no nosso país, que se desenvolvem dentro de uma cultura, que jogam em grandes times, como é que eles se desenvolvem quando eles saem do país, porque hoje o percentual de atletas que estão atuando fora é muito maior. Então eu tive a preocupação sempre de aprender com os treinadores deles, porque na seleção eles são muito mais treinados pelos treinadores deles do que pelo treinador da Seleção. Eles trazem do clube deles uma cultura diferente do que eles foram desenvolvidos. Então preciso fazer uma reprogramação disso tudo. Então vamos lá, vamos entender que a gente é brasileiro, que a gente tem esse DNA para jogar dessa forma e que a gente pode fazer isso também de forma muito organizada. Então intercambiar informações foi fundamental. Eu saí totalmente da minha zona de conforto. Saí hoje do meu país para estar em outros países participando de eventos importantes, de congresso ou de estar em conexão com outros treinadores. Eu tenho uma relação muito boa com os outros treinadores. Além do treinador ser um profissional que detenha conhecimento técnico, ele é diplomata. É uma relação diplomática. Quando você traz essas relações para dentro do teu ambiente, você aprende muito mais.
A gente sabe o quanto é significativo 100 jogos, pela longevidade como treinador. A manutenção é um desafio mas a resposta está ao analisar seus números com a seleção. gente tem todo o seu histórico, a sua projeção no Marechal Rondon, depois o seu tempo que foi muito importante em relação a conquistas no Carlos Barbosa e a seleção brasileira. Qual que é o seu sentimento quando passa esse filme na sua cabeça e você pensa todos bem que estão para conquistar o hexacampeonato mundial?
Tu destacou três pilares assim fundamentais, o início, o meio e a finalidade, né? Meu início de projeção com o Marechal Rondon foi importantíssimo na minha vida. Sobre vários aspectos, muito emocional, de muita luta, muito esforço, eu abri mão de muitas coisas, inclusive de não ver o meu filho crescer, quando fui ver ele estava moço, então o Leonardo tem essa ligação com o meu início, eu olho pra ele e digo, cara, eu não posso desistir nunca. No Carlos Barbosa tem o Pedro que me faz reforçar tudo isso, que é o meio, que é a chancela de um time vencedor, de um time grande, de um time importante e a Seleção é a finalidade de tudo, porque o que um profissional quer na carreira é chegar na Seleção. Mas eu nunca esqueci as minhas raízes. Eu nunca cheguei na Seleção e abandonei aquilo que eu acreditava, eu nunca esqueci das pessoas que me ajudaram. Eu uso uma frase sempre que eu falo que a gratidão não prescreve. E eu, todo instante que eu coloco essa camisa, eu falo assim, cara, eu tô num pódio, que é o pódio mais alto da minha profissão, e eu tô toda hora estendendo a mão pra muitas pessoas subindo comigo no pódio pra sair na foto comigo, porque as pessoas têm esse valor pra mim. Então, volta e meia eu recebo uma mensagem de um torcedor, de um dirigente de um clube que eu trabalhei lá no início, lá em Florianópolis, em Palmas, em Toledo, no Paraná, na Diondíria, em Horizontina, que é a minha caminhada, e eu digo assim, cara, vem comigo pro pódio, porque eu tô num estágio mais alto da profissão, quero que tu apareça porque tu foi importante. Então, eu acho que esse sentimento da Seleção me oportunizou fazer isso. Eu estou conseguindo, Deus está me permitindo agradecer todas as pessoas. Porque eu sei que eu estou de passagem, eu não quero perdurar aqui a minha vida inteira. Eu quero também construir outros sonhos e eu quero que outras pessoas experimentem isso. Agora, se tem uma coisa que eu vivi e as marcas no meu rosto não me deixam, foi intensamente tudo isso. Eu vivi isso aqui como ninguém viveu. E com a ajuda da minha família, da minha esposa, dos meus pais, que eu tenho certeza que eles estão muito orgulhosos da minha trajetória, porque eu cumpri o que diz a Bíblia, honrar pai e mãe. E eu honro toda a minha família e eu só agradeço a Deus por ter tido a possibilidade de chegar até aqui. Daqui para frente, o futuro de dirá e minha família está no primeiro lugar.
Com informações de d24am.