A eleição de outubro deste ano indica que ficará marcada na história como uma das mais truculentas. Só à título de exemplo, o atual prefeito do município de Coari, Igson Monteiro, que é do PMDB, assim como todos os vereadores de oposição, foram ameaçados pelo governador de transição, José Melo, de intervenção no Município se os mesmo não declarassem seus respectivos apoio à sua candidatura à reeleição.
O recado foi dado na quarta-feira, 02, em reunião com o prefeito e todos os vereadores.
Isso é de uma delinquência inominada, pois mexe com o partido de oposição ao governo do Estado e, portanto, parte de agente do governo
do Estado e de seu governador, por interesse em sua reeleição. Caso contrário, ele que venha a público rechaçar essa vergonhosa forma de chantagem eleiçoeira.
Vamos agora contribuir um pouco para minimizar a ignorância geral quanto a essa matéria. Embora pareça chato esse tipo de abordagem, acreditamos que seja didática.
A intervenção de um ente federado em outro está prevista na Constituição Federal (e também nas estaduais), mas é uma medida de extrema gravidade política, é uma medida de exceção, pois fere o princípio da autonomia dos entes federados. É mesmo uma cláusula pétrea da CF/88 (art. 60, § 4º. Inciso I), isto é, não pode ser objeto de deliberação para suprimi-la ou alterá-la. Os Estados federalistas apresentam uma repartição horizontal do poder através das competências executiva, legislativa e judiciária e uma repartição vertical do poder através da autonomia e capacidade de autogestão dos entes federados.
Embora no Estado federativo, vigore a regra da autonomia dos entes federados, em casos excepcionais, admitir-se-á a intervenção de um ente sobre o outro, situação em que ficará suspensa dita autonomia.
O Min. Celso de Mello assim se posiciona quanto a isso: “O instituto da intervenção federal, consagrado por todas as Constituições republicanas, representa um elemento fundamental na própria formulação da doutrina do federalismo, que dele não pode prescindir – inobstante a excepcionalidade de sua aplicação -, para efeito de preservação da intangibilidade do vinculo federativo, da unidade do Estado Federal e da integridade territorial das unidades federadas”. (MS 21041 / RO. Julgamento: 12/06/1991, Pleno DJ 13-03-1992 PP-02923).
A intervenção poderá ser da União nos Estados (e DF) ou dos Estados nos Municípios – intervenção federal e estadual, respectivamente.
A Constituição também deixa claras as condições em que essas intervenções podem ser feitas: por decretação do Poder Judiciário em casos de descumprimento de sentença geralmente decretada em razão de descumprimento de alguma Lei a que os Poderes estão submetidos pelo princípio da legalidade.
Assim é que a CF/88 “Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando: IV – o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual (…).” (grifo aditado)
Assim, não é por qualquer capricho quixotesco que um Melo qualquer pode sair por aí fazendo intervenção em município. Das duas, uma: ou é chantagem com base na ignorância, ou chantagem com base em má fé. Ou ambas as hipóteses.
De qualquer forma, essas informações prestadas acima deveriam ser amplamente disseminadas a fim de servir como o antídoto contra esse
tipo de patifaria política.
Ah! a chantagem foi abrandada com uma espécie sínica e sinistra promessa aos senhores vereadores e prefeito: “vou asfaltar toda a malha viária de Coari”, prometera Melo, depois de encurralar com ameaça de intervenção, 15 vereadores e mais o prefeito.