Infraestruturas e energias são as duas alavancas principais para a recuperação do crescimento no Brasil. Essa foi a mensagem do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, transmitida hoje (3) em vídeo para os participantes do seminário O Futuro do Desenvolvimento, que acontece desde ontem (2) no Rio de Janeiro. Coutinho está na Alemanha, onde participa de reunião do Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB).
Segundo o presidente do BNDES, o investimento “pode e deve ser induzido pelo Estado” em infraestruturas econômicas, logísticas e urbanas. Essas são fronteiras importantes que requerem preparação, estruturação dos projetos de engenharia, organização dos leilões, para incentivar o investimento privado de maneira favorável, para que se obtenham resultados para a sociedade e oferta de condições mais competitivas para o país, assegurou. O seminário é promovido pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE).
Em relação às energias, Coutinho disse que podem ser induzidas em termos de capacidade para retomar o crescimento, diante da demanda crescente por energias e combustíveis e também pela necessidade de se planejar com antecipação. Por razões conjunturais, os projetos nessa área não deveriam ser postergados “sem uma reflexão de profundidade”, olhando para o longo prazo.
Essas duas áreas exigem financiamento de longo prazo. “E aqui, o papel de uma instituição de desenvolvimento, como o BNDES, é essencial”. Citou ainda outra alavanca importante, que é o estímulo de uma taxa de câmbio competitiva, mais depreciada, de modo a reverter os processos de esvaziamento de cadeias industriais e de perda de oportunidade de exportação, que caracterizaram os últimos 20 anos. Essa alavanca da exportação deve funcionar de maneira firme por um período mais longo, com suporte de crédito de médio e longo prazo, para resultar em ganhos de eficiência, disse o presidente do BNDES.
Inclusão social e produtiva
Luciano Coutinho deixou claro, porém, que a capacidade de propulsão do crescimento será limitada se a política econômica e social não construir condições para que os efeitos benignos da inclusão social e produtiva das populações, especialmente de baixa renda, da expansão dos salários, além dos processos positivos de avanço em qualificação e treinamento dos trabalhadores sejam descontinuados. É preciso restaurar a capacidade de sustentação do mercado interno que, segundo ele, foi construída no ciclo iniciado em 2004 e se estendeu até 2015.
Coutinho Lembrou que “todos os processos não se reproduzirão, repetindo o passado, porque estamos diante de transformações tecnológicas importantes que tenderão a acelerar processos e a modificar as bases da eficiência e da competitividade”, como já vem ocorrendo em economias mais avançadas e também em economias emergentes. Ele não tem dúvidas que a constituição de grandes redes inteligentes no âmbito urbano e regional no prazo de dois a quatro anos levarão as infraestruturas e os sistemas urbanos a se tornarem mais eficientes em função dessa integração. Esses são vetores importantes da transformação, garantiu.
Nesse cenário, os desafios relevantes são a inovação e a sustentabilidade ambiental, que deverão ser abordados como questões estratégicas. Afirmou, ainda, que é necessário, quando se pensa o futuro, entender os grandes ciclos de transformação e a crise atual e compreender que qualquer ajuste fiscal bem-sucedido só se implementa em uma economia que cresce. “E, portanto, o sucesso de um ajustamento saudável de finanças públicas e a superação de fragilidades depende da recuperação do crescimento, e não o contrário”, disse ele.
Crise
Coutinho declarou que é difícil pensar em futuro quando vivemos a crise do ciclo registrado entre 2004 e 2015, que foi um “ciclo com características muito benignas, que o distanciam de outros momentos de crescimento da economia brasileira”. Ele destacou que nesse período, a formação bruta de capital fixo (FBCF), que são os investimentos em bens de capital, com elevação da poupança agregada, saiu de cerca de 16,5% para perto de 20%, mantendo-se nesse patamar e recuando ao longo de 2014.
O presidente do BNDES disse que nesse ciclo, “pela primeira vez em décadas”, houve avanço de forças produtivas e crescimento combinado em duas dimensões positivas. Uma foi o crescimento forte do emprego formal, com melhoria significativa dos salários reais, acompanhada de aumento da escolaridade, melhoria da qualificação, ampliação de oportunidades de pequenos negócios em várias áreas de serviços, associado a um processo de desconcentração do crescimento.
Coutinhoo afirmou que as regiões norte, centro-oeste e nordeste cresceram a taxas superiores à média nacional, com ênfase para a renda per capita, isto é, por indivíduo, que cresceu de forma mais célere em comparação à média. Coutinho assegurou que as características desse ciclo representam elementos para se pensar o futuro.
Desafios
Luciano Coutinho disse que o Brasil vive hoje o desafio de uma recessão e de interrupção do crescimento, além da necessidade de efetuar reformas para restabelecer uma funcionalidade mínima nas finanças públicas, na gestão da inflação, visando reabrir espaço para o crescimento. “Mas é preciso ter em mente que o crescimento não brotará espontaneamente da preparação de medidas fiscais, embora necessárias, ou de uma inversão de expectativas. O crescimento, na conjuntura atual, precisa ser preparado. E os desafios para reverter as tendências em curso de contração econômica são importantes, não são desprezíveis”, declarou.
Coutinhodisse que entre as dificuldades que se apresentam no momento está o ciclo desfavorável de preços externos de commodities (produtos agrícolas e minerais comercializados no mercado internacional), e o crescimento incerto do comércio exterior, A concorrência é acirrada e os preços são desfavoráveis a várias cadeias competitivas nacionais, acentuou. Apesar disso, Coutinho assegurou que o cenário não é desolador, “mas estamos muito longe do quadro favorável que prevaleceu de 2003 até 2012”.
Outro fato mais recente que também prejudica o crescimento do país e agravou problemas da cadeia produtiva de petróleo e gás e da Petrobras foi a queda de preços do petróleo do mercado exterior. “E demanda muito trabalho para que se possa reestruturar as condições, de forma que essa indústria que foi até pouco tempo um dos vetores de crescimento, possa representar de novo um vetor para a economia”, segundo o presidente do BNDES.
Coutinho ressaltou a existência ainda do risco de “desfazimento dos fatores benignos da dinamização do mercado interno” que foram o aumento dos salários reais e do emprego, que viabilizava a expansão do crédito para as famílias e permitia o crescimento de regiões menos desenvolvidas. Ele explicou que “pelo menos no curto prazo”, o Brasil não dispõe dessa força de tração que o mercado interno representou no período recente.