Senado aprova projeto de educação bilíngue para surdos; texto vai à Câmara

O Senado aprovou ontem, em sessão remota, o projeto que inclui novos itens na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei 9.394, de 1996) para qualificar a educação bilíngue de surdos como uma modalidade de ensino independente (PL 4.909/2020). A educação bilíngue, nesse caso, tem a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como primeira língua e o português escrito como segunda língua. O autor do projeto é o senador Flávio Arns (Podemos-PR); o relator foi o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN). O texto segue agora para análise da Câmara dos Deputados. Ao apresentar o projeto, no ano passado, Flávio Arns ressaltou que sua iniciativa atendia a demandas da comunidade surdos. Essa federação defende que a educação bilíngue seja vinculada à LDB — e desvinculada da educação especial.

RELACIONADAS Alunos da rede estadual de SP terão aulas de inglês a partir do 1º ano Por falta de verba, UFRJ não deve retomar aulas presenciais em 2021 Mulher se forma após ‘pausa’ de 54 anos na faculdade, no mesmo dia que neta O texto aprovado no Senado inclui na LDB, entre os princípios do ensino no país, o “respeito à diversidade humana, linguística, cultural e identitária das pessoas surdas, surdo-cegas e com deficiência auditiva”. Também acrescenta à LDB o capítulo “Da Educação Bilíngue de Surdos”. Ainda de acordo com a proposta, a educação bilíngue será feita em escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou em polos de educação bilíngue de surdos. E o público a ser atendido será de educandos surdos, surdocegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação, ou com deficiências associadas.

Inclusão Em seu parecer, Styvenson Valentim registrou que a proposição é uma forma de fazer justiça a uma demanda histórica da comunidade surda brasileira. Ele disse que as escolas bilíngues apresentam “significativo potencial para contribuir efetivamente para a inclusão de fato dessas pessoas nas escolas brasileiras, pois leva em conta especificidades linguísticas, culturais e identitárias”.

Trata-se, portanto, de fazer verdadeira inclusão, garantindo a igualdade de condições de acesso e a permanência nas escolas’, afirmou.

Styvenson rejeitou as emendas apresentadas em Plenário, mas acrescentou ao texto emendas de sua iniciativa para explicitar que a educação bilíngue será opcional. De acordo com ele, é preciso “explicitar no texto do projeto a determinação de que os alunos que tenham esse perfil ou seus responsáveis continuem a contar com a possibilidade de matrícula em escolas, ou classes não bilíngues, sem prejuízo para as conquistas realizadas no âmbito da LBI [Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Lei 13.146, de 2015] e das outras normas relacionadas à inclusão de pessoas com deficiência”. Segundo o relator, a emenda foi uma sugestão da senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP).

Modalidade de ensino independente

Na justificativa do projeto, Flávio Arns afirma que, “por muitos anos, a educação bilíngue de surdos vem sendo incluída como parte da educação especial, embora já existam tanto científica e pedagogicamente quanto culturalmente razões suficientes para que ela seja considerada uma modalidade de ensino independente”. Com o projeto, a educação bilíngue de surdos fica vinculada à LDB, deixando de ser considerada especial. A ideia é promover uma maior inclusão.

Arns destaca que a língua acessível para os surdos é a Língua Brasileira de Sinais (Libras), e que esta é, em geral, a primeira língua adquirida por esse público. Ele também ressalta que os surdos têm questões linguísticas envolvidas no processo de ensino e aprendizagem, diferentemente de estudantes com outras deficiências. Segundo o senador, pode-se fazer um paralelo entre o ensino de surdos e o ensino de indígenas, tendo em vista as especificidades linguísticas desses grupos.

Programas de ensino e pesquisa

Pelo projeto de Flávio Arns, os sistemas de ensino devem desenvolver programas integrados de ensino e pesquisa para oferta de educação escolar bilíngue e intercultural aos estudantes surdos, com os objetivos de lhes proporcionar “a recuperação de suas memórias históricas, a reafirmação de suas identidades e especificidades e a valorização de sua língua e cultura”.

A União, de acordo com a proposta, vai conceder apoio técnico e financeiro para esses programas. Eles serão planejados com a participação das comunidades surdas, de instituições de ensino superior e de entidades representativas dos surdos.

Atendimento especializado

Para atender às especificidades linguísticas dos surdos, deverá haver, quando necessário, serviços de apoio educacional especializado, como o atendimento educacional especializado bilíngue. Além disso, o projeto estabelece que a oferta de educação bilíngue de surdos terá início desde o nascimento e deverá se estender ao longo da vida. O projeto também prevê a oferta, aos estudantes surdos, de materiais didáticos e professores bilíngues com formação e especialização adequadas, em nível superior.

Debate

Inicialmente, a votação dessa matéria estava prevista para 12 de maio, mas a senadora Mara Gabrilli apresentou um requerimento para a realização de uma sessão de debates sobre o assunto, que aconteceu na última sexta-feira (21), com a presença de ativistas e representantes de entidades ligadas aos direitos dos surdos.

Ao comentar esse debate, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que a sessão foi marcada pela inovação, já que contou com recursos de acessibilidade como Libras, legendas em tempo real e auto-descrição. Ele acrescentou que a sessão foi feita com intérprete de voz, além de guias intérpretes, com a transmissão do encontro no canal oficial do Senado no Youtube. Pacheco também lembrou que houve participações por meio do portal e-Cidadania, com o recorde de 439 interações populares. “Essas ações revelam a preocupação do Senado em garantir a plena participação democrática a todo cidadão, independentemente de suas limitações. Mais uma vez o Senado assume papel de destaque, com o compromisso com a acessibilidade”, disse.

Acessibilidade

As transmissões da TV Senado, inclusive as sessões do Plenário, são acompanhadas de tradução em Libras. O site da Casa também apresenta recursos de acessibilidade. Há 13 anos, o Senado mantém o Senado Notícias em Braile, que é um resumo das notícias de cada mês, enviado para cerca de 150 instituições de assistência a deficientes visuais do país. Esse jornal é impresso pelo Serviço de Braile da Gráfica do Senado, que conta, inclusive, com uma equipe de revisores cegos.

O projeto Integrar e o Plano de Acessibilidade adequaram os espaços físicos do Senado, com a construção de rampas e a instalação de sinalização tátil de piso, além da oferta de triciclos, cadeiras de roda motorizadas, vagas especiais de estacionamento e carros adaptados. Há cerca de 200 pessoas com deficiência que integram o corpo funcional da Casa.

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