A quarta-feira de Michel Temer foi de silêncio. Ao menos sobre os questionamentos que interessavam à imprensa.
“Presidente, como é ter cinco ministros na lista do [procurador-geral Rodrigo] Janot?”, arriscou um repórter. Não houve resposta.
Era a segunda vez que o peemedebista evitava os jornalistas em poucos horas. Na noite anterior, uma crise sem precedentes havia começado, com o vazamento dos primeiros nomes do gabinete que o procurador-geral deseja investigar com base nas delações da Odebrecht e com a certeza de que muitos de seus aliados no Congresso tampouco estarão a salvo.
Ainda assim, fugir da imprensa estava longe de ser seu único inconveniente no dia. Nas ruas, mobilizações contra a reforma da Previdência ganhavam fôlego, trazendo mais dificuldades para a aprovação no Congresso de um projeto já impopular entre os parlamentares.
O presidente não mencionou os protestos pelo país, mas fez questão de defender publicamente sua proposta para a Previdência nesta quarta.
Pela manhã, durante o lançamento de um programa do Sebrae e do Banco do Brasil que dará emprego a bancários aposentados, ele disse, de forma apaixonada, que a reforma não pretende retirar direitos e que o projeto busca evitar um “colapso da aposentadoria”.
Chegou ainda a ponderar que modificações na proposta podem ser feitas no Congresso. “Mas não podemos fazer uma coisa modestíssima agora para daqui a quatro, cinco anos, termos que fazer como outros países que tiveram que fazer um corte muito maior porque não preveniram”, disse ele.
O aceno às possíveis mudanças não são à toa. O presidente falava ao público, mas também a nomes do Parlamento, que não escondem o desconforto com o projeto original enviado pelo Planalto, que aumenta as exigências para a aposentadoria, incluindo regra que iguala a idade mínima para que homens e mulheres obtenham o benefício.
No final da tarde, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), decidiu reabrir e estender até sexta-feira o prazo para que os deputados apresentem emendas para a proposta _até o fim do período original, na terça, 146 pedidos de modificações já haviam sido apresentados, muitos deles de aliados.
O problema para o Planalto é que tanto os protestos quanto a Lava Jato devem ter efeito desagregador sobre sua até agora disciplinada base de apoio no Congresso.
A um ano da próxima campanha eleitoral, quando muitos dos parlamentares tentarão se reeleger, o Governo já sabia que teria de vencer a resistência dos aliados em aprovar uma reforma tão impopular quanto a da Previdência.
O custo de apoiar o Governo crescerá ainda mais se as manifestações desta quarta ganharem peso e constância _daí a decisão do Planalto de intensificar campanhas pela Internet e pela TV em defesa da projeto.
No plano estritamente político de reação à Lava Jato, a ordem do Planalto é privilegiar as pautas positivas para tentar diminuir os efeitos provocados pelos pedidos de abertura de inquérito feitos por Janot na terça-feira que, segundo a imprensa nacional, incluem cinco ministros:
Eliseu Padilha (Casa Civil), Moreira Franco (Secretaria Geral), Aloysio Nunes (Relações Exteriores), Gilberto Kassab (Ciência e Tecnologia) e Bruno Araújo (Cidades). Nesta quarta, o Jornal Nacional, da TV Globo, revelou que mais nome do gabinete estaria envolvido: Marcos Pereira (Desenvolvimento, Indústria e Comércio).
Parece pouco para manter o Governo em marcha e acalmar o clima de salve-se quem puder instaurado no Parlamento: dentre os 83 inquéritos pedidos por Janot, cuja abertura Fachin deve aprovar nos próximos dias, devem estar os nomes de muitos deputados e senadores, incluindo responsáveis pela articulação do governista nas Casas.
Já se sabe que constam, na lista, os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM) e Eunicio Oliveira (PMDB) e os senadores Aécio Neves e José Serra (PSDB) e Romero Jucá, Renan Calheiros e Edison Lobão (PMDB).
“Nós já sabíamos que a lista viria e que ela vai aumentar o desgaste do Congresso. É um momento grave, delicado e sem precedentes”, afirmou à imprensa o senador Ronaldo Caiado (DEM).
EL PAÍS