Ministros do Supremo repudiam ações da Polícia Federal em universidades

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes afirmou nesta sexta-feira (26/10) que é preciso “ter cautela” em ações em universidades públicas por conta de manifestações a favor ou contra os candidatos à Presidência da República nas eleições 2018. As declarações do ministro foram dadas após uma série de ações da Polícia Federal em instituições pelo país nas últimas 48 horas — foram 17 intervenções em nove Estados.

Na quinta-feira (25/10), uma juíza no Rio ameaçou prender o diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense se não fosse retirada uma faixa “Direito UFF Antifascista”. “Em geral (as universidades) têm uma ebulição que é positiva, que não necessariamente estão afeitos ao período eleitoral”, afirmou o ministro.

Ainda nesta sexta-feira, alunos da Faculdade de Direito da USP realizam uma paralisação em protesto contra o presidenciável Jair Bolsonaro, do PSL. Por meio de sua conta no Twitter, a Faculdade disse que “Havendo professores e alunos, será garantido o funcionamento regular”. Um evento agendado para esta sexta-feira sobre direito autoral teve de ser antecipado em virtude da paralisação.

O também ministro do STF Luís Roberto Barroso foi outro a se pronunciar sobre o caso. De acordo com a colunista do jornal Folha de S. Paulo Mônica Bergamo, Barroso teria declarado, antes de entrar para conceder uma palestra em uma universidade colombiana: “Não me pronuncio sobre casos concretos. Mas o modo como penso a vida, a polícia, como regra, só deve entrar em uma universidade se for para estudar”.

O ministro Marco Aurélio Mello endossou o coro dos colegas de STF e avaliou a interferência como “incabível”. “Universidade é campo do saber. O saber pressupõe liberdade, liberdade no pensar, liberdade de expressar ideias. Interferência externa é, de regra, indevida. Vinga a autonomia universitária. Toda interferência é, de início, incabível. Essa é a óptica a ser observada. Falo de uma forma geral. Não me pronuncio especificamente sobre a atuação da Justiça Eleitoral. Mas reconheço que a quadra é de extremos. Por isso é perigosa, em termos de Estado Democrático de Direito. Esse é o meu pensamento”, afirmou.

Um outro ministro do STF ouvido em caráter reservado pela reportagem definiu os episódios como um “um horror”.

Um integrante do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que preferiu não ser identificado destacou à reportagem que manifestações partidárias em prédios públicos são proibidas, mas lembrou que isso não se aplica a atos genéricos, sem conteúdo partidário, que discutam política. Para este ministro, a atuação de Tribunais Regionais Eleitorais nestes casos apresenta um “rigor excessivo”. Ele também destacou, por outro lado, que é preciso entender se há alguma ação organizada, o que pode ensejar algum rigor maior da Justiça.

Por sua vez, um outro ministro da Corte Eleitoral acredita que houve abuso de autoridade.

Nesta sexta-feira, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal, lançou nota pública em que ressalta que a vedação de uso de bens públicos para propaganda eleitoral não se confunde com a proibição do debate de ideias. “Nem mesmo a maior ou menor conexão ou antagonismo de determinada agremiação política ou candidatura com alguns dos valores constitucionais pode servir de fundamento para que esses valores deixem de ser manifestados e discutidos publicamente”.

Questionado se seria responsável por algum tipo de orientação ou direcionamento nos casos, o TSE apenas destacou em nota que tais decisões não partiram da Corte Eleitoral.

Outros casos

 

Pelo menos duas universidades — a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba, e da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), campus de Serrinha (a 175 km de Salvador) — foram alvo nesta quinta-feira de ações da Justiça Eleitoral ou do Ministério Público Eleitoral por suposta propaganda eleitoral irregular a favor do candidato do PT ao Palácio do Planalto, Fernando Haddad, que disputa o segundo turno das eleições presidenciais com Jair Bolsonaro (PSL).

Já na Universidade Federal de Grandes Dourados (UFGD), no Mato Grosso do Sul, a Polícia Federal impediu, na manhã desta quinta, a mando do juiz eleitoral Rubens Witzel Filho, a realização de uma palestra sobre fascismo marcada para acontecer na instituição de ensino. Na decisão, o magistrado alegou que o prédio, por ser público, não poderia ser usado para campanha política, já que Bolsonaro era citado nos materiais de divulgação da aula. Em uma dessas peças, compartilhada nas redes sociais, os estudantes alertavam para “o perigo da candidatura de Bolsonaro” para o país.

A Justiça Eleitoral fez outras interferências em universidades públicas nesta semana. Na última terça, uma faixa contra o fascismo pendurada no campus de Niterói da Universidade Federal Fluminense (UFF) foi retirada por agentes da PF, a pedido do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ). A ação gerou uma manifestação dos estudantes na quarta-feira. Eles alegam que a atuação da corporação foi arbitrária e que a faixa, com a inscrição “Direito UFF Antifascistas”, não fazia referência a nenhum candidato.

Também na quarta, em Minas Gerais, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) exigiu que a Universidade Federal de São João Del Rei retirasse uma nota publicada do site oficial, em que a instituição reafirma “seu compromisso com os princípios democráticos”, mencionando que a Universidade sempre adotou as cotas no vestibular e o uso do nome social para pessoas trans.

 

Corpo na UFRJ

Na manhã desta sexta, a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro encontrou um corpo com marcas de bala abandonado no interior de um carro, na frente da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND-UFRJ).

O carro estava estacionado exatamente ao lado de um grupo de estudantes que participava de uma aula pública contra o fascismo. Uma postagem do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (Caco), do Direito da UFRJ, mostra o veículo próximo aos participantes da aula, antes de o corpo ser descoberto.

 

 

 

Em nota, o Caco disse ainda não ter muitas informações sobre o caso, mas que, até o momento, acredita-se que a pessoa encontrada morta “não faz parte do corpo social da FND”.  CORREIO BRAZILIENSE

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